6 de janeiro de 2012

Dona Irene

Quando cheguei em sua casa era próximo a hora do almoço. 11h20 para ser mais exata. Me esperava na porta do seu apartamento. Número 802. O tamanho, próximo a 1,50m. Mas a estatura era inversamente proporcional a simpatia e ao sorriso. Me convidou para entrar. O som do ambiente era sobre o assunto que iríamos tratar: a rádio Itatiaia. O dia todo sintonizada. Só desliga quando está dormindo e nos horários das novelas. Ambiente formidável, como define a sua estação de rádio favorita. Móveis antigos. Tão antigos quanto a sua paixão: o Galo. O amor está estampado em cada canto da casa. Assim como as fotografias de família. No corredor, uma radiola. Último presente da sua mãe, que foi embora no dia em que o Brasil ganhou o primeiro campeão brasileiro de futebol. Misto de alegria e dor, comum a todo torcedor atleticano. O papo fluiu rápido, mas durou muito. Exibiu com orgulho os recortes dos jornais, os postêrs do time do coração, os LP’s e compactos feitos pela Itatiaia. São relíquias, que apesar da materialidade e da idade avançada, consegue reviver na memória e expressar em detalhes. Oitenta e oito. Essa idade não é para qualquer um. E que lucidez! Fala sobre futebol melhor do que os jovenzinhos que andam por aí. Chega até a ser invejada, como me mostrou, em um comentário feito por um rapaz, em uma matéria publicada por outro jornal. De uma simplicidade singular, me confessou o seu maior sonho: conhecer a Itatiaia. Ver todas as vozes que lhe fazem companhia a mais de 30 anos. Afinal, mora sozinha: ela, Deus, as lembranças, a rádio e o Galo. Coleciona pequenos troféus, como o chaveiro que ganhou das mãos de Telê Santana, em 1971. Desse, ela não vai desgrudar nunca. Nem quando fizer a passagem. Tanto carinho, dedicação e histórias davam para montar um museu. Pôs a radiola para funcionar e ouvi paródias antigas que enalteciam o Galo. E escutei a cobertura da visita do Papa João Paulo II, em 1980, na voz de Zé Lino. Com a esperteza, que só a sabedoria é capaz de nos dar, tem um plano. Mostrar ao dirigente do Atlético todos os seus guardados e exigir um “Galo de Prata”. Ela merece, oras! Depois de uma vida toda devotada ao Carijó. Com o calor, me ofereceu um refresco ou um Mate Couro. Recusei. As suas palavras me bastavam. Posou para as fotos como quem já estava acostumada com a fama, segurando a bandeira alvinegra. Dona Irene. Pessoa ilustre. Encantadora. Merece muito mais que um troféu de prata. Merece um troféu de ouro pela simpatia e solicitude. Mas, sinto muito Dona Irene, quem ganhou o prêmio hoje fui eu, por conhecer a senhora. Salvou meu dia. Foi um prazer.