2 de junho de 2010

A arte de não saber fazer

Ela estava no 5º período de jornalismo. Aquele período conhecido como o “quinto dos infernos”: você não sabe se fez a escolha certa, fica com várias dúvidas quanto a profissão, se larga tudo e vai fazer um intercâmbio ou trabalhar. Ainda por cima, tem várias tarefas práticas acadêmicas que exigem tempo mental e concreto. Para alimentar mais a sua incerteza, a professora pede para ela escrever uma crônica.

Crônica? Um texto cheio de liberdade e lirismo, que instigue o leitor e mostra de forma irônica, engraçada, poética e sabe mais lá o quê, a realidade. Sinceramente, ela não estava com a cabeça para essas coisas. Não que não gostasse de crônica, mas era melhor leitora e apreciadora do que cronista. Bom, isso ao menos era uma certeza.

Sentou, então, em frente ao computador em uma sala da faculdade. Digitou o seu registro acadêmico e sua senha. Abriu o documento do Word e surgiu aquela imensa tela em branco. Vazia como a sua mente que, desesperada, não sabia sobre o que escrever. O cursor piscava, pedindo incessantemente para que ela digitasse uma palavra. Uma letra. E ela nada. A velocidade do cursor era mais rápida que a ordenação das suas idéias opacas e frias, como o clima que fazia naquela primeira manhã de junho.

Ouvia algumas idéias, olhava para os colegas de classe, compenetrados em frente a tela dos seus computadores, e só conseguia pensar: “Crônica é difícil, como vou tocar os outros com uma coisa simples e ao mesmo tempo complexa?” Para piorar a situação, a professora sentou ao seu lado para ler um jornal. Não qualquer jornal, mas o Caderno 2 da Folha de São Paulo, o bendito que traz sempre crônicas e textos com o viés literário tão almejado e elogiado pelos jornalistas. Situação nada opressora para a pobre coitada que tentava escrever, em vão, uma crônica digna de ser lida.

Rodava a cadeira, digitava palavras toscas e apagava. Parava, olhava para um ponto fixo no teto em busca de um tema, de uma nesga sobre um assunto um tantinho interessante, para que pudesse regurgitar aquelas malditas palavras que precisavam ser encadeadas em formato de uma crônica. Para piorar, a porta da sala onde estava abria e fechava toda hora, entrava gente e um frio que paralisava os músculos da mão e a fluidez do pensamento. Ela perdeu as contas de quantas vezes levantou para fechar a irritante porta. E foi assim, até o fim daquela aula fatídica. Sobrou a ela a frustração e a angústia de não conseguir traduzir um fato banal do cotidiano. Desolada, entregou esse texto, que quem sabe, poderá se disfarçar de crônica e passar despercebido pelo olhar crítico da professora que tanto o aguarda.

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